PERDA

Perdemos pessoas, e esta é a mais expressiva perda que sofremos – deixa marcas, vazios, abismos, e uma dor irremediável. Pela morte somos forçados a aceitar a ausência de quem amamos, considerando que a maioria de nós não saiba lidar bem com esta partida. Quando as pessoas se vão de nossas vidas, ou nós saímos das suas, vivemos o período de luto pela perda de tudo que a pessoa representa, ou representou. Ela pode ser, ou ter sido, nosso sonho mais perfeito, pode representar o significado mais absoluto da expressão felicidade. Talvez sejamos nós seu mundo mais bonito, e que, por inúmeras razões, perdeu esse valor, deixando de fazer sentido – tanto que nos deixam partir. Nos dois casos, a perda é dolorosa, e atinge as defesas que possuímos, nos cobram um preço alto e custamos a nos recompor.
No entanto, as perdas são mais presentes na nossa vida do que percebemos, enquanto vivemos o cotidiano. Perdemo-nos dos nossos sonhos, no caminho, de nós mesmos.
Perdemos a fé, a viagem, o horário. Perdemos a paciência em momentos cruciais. E perdemos a direção, o propósito, o encanto. Perdemos a ousadia nas circunstâncias em que a capacidade de ousar pode fazer a fundamental diferença.
Perdemos o lugar na fila, papéis importantes, o interesse. Oportunidades são perdidas, assim como o avião, as ideias, o bom humor. Perdemos a hora, a consulta, o amigo. Perdemos a noção, a vergonha, a postura.  Perdemos o jogo, o emprego, a competição. A beleza, o espaço, a segurança. Perdemos a razão, a malícia, a vaidade. O sorteio, a festa. Perdemos a certeza. Caem os dentes, o lucro, a delicadeza. Perdemos a visão, o voto, a sanidade, a educação. Perdemos a inocência, a fala, o bonde. Perdemos a alegria, o ânimo, a constância, a determinação. Perdemos peso, bens materiais, a auto-estima.
Perdemos a melodia, o momento, o equilíbrio, a fome, o sono. Perdemos a capacidade de nos surpreender, e aos outros. Perdemos a habilidade em tratar de nossas questões e resolver os conflitos. Perdemos o suspiro de prazer, ganhamos a angústia para cuidar. Perdemos o colo, ganhamos o mundo. Perdemos o gol feito, a voz, o medo. Perdemos a esperança, o desconto que não pedimos. Perdemos as lembranças, a agilidade, a memória. Perdemos o respeito, o senso crítico, a amabilidade. Perdemos boa parte do dia dedicando atenção desnecessária a assuntos desimportantes. Perdemos a lucidez, a timidez, o desejo, a juventude. A graça, o sentido, a espontaneidade.
Perdemos chances únicas, valores antigos e tempo. Perdemos tempo entristecendo por tão pouco, considerando opiniões e pessoas que não somam, incentivando quem não quer nenhum tipo de ajuda – e deixa isso claro.  Perdemos tempo acorrentados a um passado feliz, ignorando o futuro gestado num descuidando presente. E quanto tempo perdemos em lamentações, justificativas, porquês, medos, anseios, procuras vãs de coisas de pequena importância e valia! Talvez devêssemos gastar mais desse tempo repensando-nos, (re)avaliando sentimentos, comportamentos, buscando e encontrando  soluções, novas formas de combater as dificuldades, resolver algumas questões, conhecer um pouco mais desse ser que construímos, e que perde sim, para ganhar experiência, força, recursos e evoluir.
Perdemos a saúde, por fim a vida. Mas, antes, corremos o risco de perder a paz, enquanto pranteamos as perdas grandes, desprezando as pequenas desistências diárias que fazemos em direção à morte… de tudo que já foi importante, da essência de tudo que nos faz sorrir e olhar a vida com os olhos curiosos de uma criança, daquilo que arrepia os sentidos, faz pulsar o coração, a vida valer a pena!
Denise Araujo

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